UMA CARTA VINDA DE LONGE
Com pedido de publicação, enviou o Dr. Howard Philips Lovecraft uma carta em que se refere a alguns comentários que a imprensa tem produzido acerca da actualidade lusitana, nomeadamente a mais escalofriante.
O Dr. Lovecraft, que é actualmente o cônsul de Portugal em Providence (Rhode Island), além do seu trabalho universitário e público, prefaciou a edição estrangeira do último livro de Aguinaldo Rebelo de Sousa, primo do deputado Idalino Rebelo da Silva, o autor de relatos de análise política como "O caso de Charles Dexter Ward" e teoria económica como "A sombra sobre Innsmouth".
Segue a missiva, a que não modificámos uma vírgula:
"Solicito publiquem esta minha carta, ainda que ela pareça apenas um relato provindo da imaginação mais desatada e sem regras apoiadas na realidade dos factos a que um espírito são estaria votado
E é assim que alguns, levados talvez por um hausto de confusão ou de ensandecimento, dizem que os recentes aumentos da gasolina, as palhaçadas da célebre lista de professores colocados ao deus dará e outros sucessos ominosos tais como as tricas do futebol financiado, são fruto não do destino perverso mas sim dum destrambelhamento de governantes, nomeadamente daqueles que, numa região mais ou menos fora das rotas normais, perplexamente dão ao coiro lusitano razões para se sentir atingido não pelos caprichos dos deuses mas pela aterrorizadora acção dos homens. E isto o repudio com todas as veras do meu ser mortal!
Também vejo com inquietação que num solar vetusto das redondezas, vulgo São Bento, diferentes presenças estranhas se congregam entre si para levarem a cabo não se sabe bem que estarrecedoras acções, que a memória dos antigos tinha como desafiando a própria lei da vida, realizando numinosos conciliábulos que nem me atrevo a descrever.
Também considero inquietante que se continue a tentar perverter a acção produtiva do meu particular amigo Segismundo Santana Lopes, um senhorão da política com paralelo apenas em Abdul Alahzred, o do "Necronomicon" ou em Joseph Frankenstein, neste momento presidente da Câmara de Aylesbury, onde existe um ambiente muito mais tenebroso - e apelo ao espírito são dos que ouvem o meu relato - que a simples cidade de Lisboa, onde as coisas, admito-o democraticamente, nem sempre serão as menos funestas.
Ou até mesmo, vá lá, no Porto, terra às vezes de solertes asserções dum senhor Pinto del Rio de assombrada, conforme rezam os cânones, memória e tradição.
Mas isso seriam contos largos, dignos da pena horrificada de um outro novelista do empíreo.
Com os melhores cumprimentos, senhor cronista, fico assustada e atentamente
Howard Philips Lovecraft
Economista e Analista Político, cônsul luso em Providence"
Nicolau Saião