Post Scriptum # 242
Para os delicadinhos da silva (1ª parte)
O mais célebre livro de boas-maneiras é, provavelmente, o "Tratado de civilidade e de etiqueta" que sua autora, a Sra. Condessa de Gencé - chamada em solteira Mireille de Bernalle - deu à luz no ano da graça de 1912, em Paris.
A nossa Mireille, que enquanto moça parece que era um pedaço de madame, para além de ser daquel'arte tinha também muito jeito para a afectuosa frequentação de fidalgos, pelo que apanhou em voo o garboso Henry de Gencé, se calhar no fim de um passeio a cavalo pelas coutadas do excelente titular, que como perfeito "sportsman" era grande apreciador de garranos, potros e éguas.
E como comprava tudo já feito - como se diz na minha região - para ocupar o tempo que lhe sobrava e em que o seu prezado consorte estaria entretido noutras cavalgadas, escrevicou o renomado tomo, que é uma delícia de leitura principalmente para quem goste de humor negro e, aqui entre nós, me custou os olhos da cara num alfarrabista do Quartier Latin.
A excelente condessa, inteiramente a sério, debruça-se com propriedade sobre temas tão excitantes como "o lenço de algibeira, o bocejo, o espirro, o cumprimento com a cabeça, com o chapéu, o aperto de mão" - e estes encorajadores itens fazem parte só dos preliminares, como refere com candura e juro que não estou a ser brejeiro - porque o que vem lá p'ra diante ainda é mais... mavioso: as "segundas núpcias, o enlace de uma senhora já com alguma idade" (como ela diz numa expressão "politicamente correcta" "avant la lettre"), "maneiras de proceder para com um morto", entre muitas outras vigorosas iguarias. Um delírio!
Nas próximas duas edições desta sub-rubrica dar-vos-ei inteiramente de borla alguns fragmentos das lucubrações da prezada Mireille, não só tendo em vista melhorar as vossas maneiras, que poderão estar precisadas, mas também para que os mais traquinas se possam divertir com proveito.
E, já agora, saibam que também o Jules Morot aqui há anos se debruçou sobre a etiqueta, tendo feito vir a lume um ramalhete de suculentas reflexões de que, lá para o Verão, também vos ofertarei algumas florzinhas.
Mas como o Jules é surrealista, preparemo-nos para esperar o pior...
Nicolau Saião
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