31.5.04

O Povo é Sereno # 104

A DEPRESSÃO NACIONAL



Tomei há pouco tempo conhecimento da existência em Portugal de um movimento destinado a restaurar o optimismo nacional e a elevar a estima dos portugueses, levando-os a afastar o seu "pessimismo" e a esquecer o que há de negativo em Portugal. Perante estas boas intenções, pensei: Tivemos momentos de esperança, como as revoluções de 1820, 1910 ou 1974, mas sempre que avistámos raios de luz, a inércia foi fazendo o seu trabalho, ao colocar no governo e na administração pessoas cuja competência se concretiza apenas quando governam os seus interesses e os da sua clientela política e social, institucionalizando (através da justiça e da fiscalidade, por exemplo) oligarquias corruptas, quando não autênticas plutocracias.
É difícil não se pensar assim quando se é cidadão português e não se tem barriga cheia. Infelizmente, o conjunto dos exemplos de boa conduta e de exigência social existentes em Portugal nunca poderá tranquilizar os nossos concidadãos. Quem pode estar tranquilo quando tem sobre a cabeça a ameaça de um Estado abusador e negligente? A fiscalidade sobrecarrega a classe média para aliviar os poderosos. Por todo o lado é promovida gente sem currículo nem competência, mas com mal-disfarçada vontade de "subir". O mérito é desvalorizado na administração pública. O sistema de ensino tenta camuflar o insucesso. Os direitos e ansiedades dos cidadãos são desprezados. A gestão do território em termos ambientais, urbanísticos, económicos e culturais é caótica. Há empresários que impunemente exploram o trabalho através da chantagem, que fecham ou mudam a localização das suas empresas. Sectores estratégicos da vida nacional são colocados em mãos privadas. O governo tenta diminuir a despesa pública cortando nos que já pouco têm, "esquecendo" que melhor seria aumentar a receita taxando os que mais ganham.
Os exemplos são múltiplos e variados. Claro que existem muito boas práticas nalguns locais - mas chegará tão curto lenço para cobrir a larga face de tão grande negrume?


Ruy Ventura