31.1.05

O Silêncio é de Ouro #192



Este fim-de-semana, a Antena 2 dedicou uma boa parte da sua programação à transmissão em directo de alguns espectáculos da Folle Journée de Nantes, este ano dedicada a Beethoven e amigos. Há muito que não se assistia a uma jornada de rádio tão animada. A Antena 2 teve na cidade francesa vários enviados especiais que iam dando conta, em directo, do que estava a acontecer nas várias salas da Cité des Congrés, fazendo lembrar uma reportagem num festival rock, com entrevistas a músicos, espectadores, comentários, críticas, etc. A captação de som não era brilhante, mas dada a natureza da emissão esse pormenor tornou-se irrelevante. Ao fim da tarde de Sábado, tive a sorte de ouvir Burmester oferecer algumas das sonatas para piano de Beethoven, entre as quais uma interpretação absolutamente fabulosa de "Clair de Lune". Ah, tripeiro!

Cimbalino Curto #141

Há alguns anos, num trabalho de pesquisa sobre costumes e tradições que fiz no vale de Campanhã, falei com várias pessoas que me disseram que, ainda há pouco mais de meio século, uma das actividades mais apreciadas pelos habitantes da zona oriental da cidade era, ao domingo, a pesca da truta nos rios Tinto e Torto. Estes dois ribeiros têm origem nos concelhos a oriente do Porto, atravessam o vale de Campanhã e desaguam no Douro, num local chamado Esteiro, na zona do Freixo, onde em tempos também existiu uma das principais praias fluviais da cidade. Tinto e Torto são responsáveis - ou, melhor dizendo, foram - pela espantosa fertilidade dos solos do vale de Campanhã, outrora uma espécie de grande centro de produção de géneros agrícolas, fundamental para o abastecimento das populações que viviam nas zonas mais centrais da cidade.
Entretanto, e em resultado de vários factores, com destaque para o rápido e desordenado crescimento industrial de Campanhã, os rios Tinto e Torto transformaram-se em dois grandes esgotos, com o habitual rol de consequências para o ambiente e saúde pública que já todos conhecemos. Para além de esporádicas denúncias dos grupos ambientalistas, não me recordo de nenhuma iniciativa consequente deste e dos anteriores executivos no sentido de despoluir e requalificar estes ribeiros.
Ora, este fim-de-semana, Rui Rio e o seu staff, acompanhados pelo Secretário de Estado dos Assuntos do Mar, inauguraram, "com pompa e circunstância", como dizem os jornais, o "Pólo Fluvial do Freixo", que inclui uma marina, restaurante, esplanada e oficina, localizados justamente a poucos passos da foz dos rios Tinto e Torto. Até aqui tudo bem. Só podemos aplaudir uma obra que permitirá valorizar uma zona esquecida durante décadas. A verdade, porém, é mais malcheirosa. O complexo foi inaugurado sem um estudo formal de impacto ambiental e, pasme-se, sem a necessária despoluição dos rios Tinto e Torto. Ou seja, temos agora um belíssimo pólo fluvial, no Esteiro, construído sobre um imenso esgoto de águas escuras e terrivelmente malcheirosas. Não sou especialista em matérias ambientais e não sei quanto tempo pode demorar a despoluição de dois ribeiros como os que estão em causa, mas creio que, durante os próximos meses, tomar uma bebida na esplanada da marina será uma experiência verdadeiramente inesquecível.

Umbigo #135



Ao rever uma fotografia da jovem Clarice Lispector no Mil Folhas desta semana, não consigo deixar de pensar que a primeira prova do virtuosismo da escritora brasileira estava no seu próprio corpo: Lispector era boa como o milho! Ou, usando uma expressão com um tom mais próximo do sabor tropical, era gostosa pra caramba!

Señor Tallon #96

Por que é que a maioria dos nossos "fazedores de opinião" - profissionais ou não, colunáveis ou nem por isso - que lamenta a excessiva dependência das instituições do país em relação ao Estado, também já viveu, vive ou continuará a viver à espera das "sopinhas" do dito?

O Silêncio É de Ouro #191



Efeito Guronsan para manhãs de segunda-feira.

28.1.05

Post Scriptum # 471

Rubrica "BIC Laranja, BIC Cristal, duas escritas à vossa escolha."




Nenhuma lingua do mundo
Saberia dizer o que eu sentia.
(Giacomo Leopardi, A Sílvia.)


Eu não sei como dizer-te que cem ideias
dentro de mim, te procuram.
(Herberto Helder, Tríptico II.)

Post It #251

Porn queen Jenna Jameson calls her autobiography a "cautionary tale," and Mayor Bill White is taking precautions about making it available to Houston library patrons.
White recently ordered that the library's dozen copies of Jameson's best-selling How to Make Love Like a Porn Star: A Cautionary Tale be removed from open shelves.

E, no Porto, ainda nos queixamos do Rio! Livra!

Ilha dos Amores # 123



Ainda a propósito da exposição de pintura de Nicolau Saião, patente no Instituto Politécnico de Portalegre, até 25 de Fevereiro, recebemos este texto de Ruy Ventura.

NICOLAU, PINTOR

Antes de conhecer Nicolau Saião como poeta e como cidadão, conheci-o como pintor. Melhor dizendo: antes de contactar com a poesia e com a vertical acção cívica deste Homem, comecei por me interessar pela sua pintura. Houve mesmo uma época em que, para mim, ela era apenas pintor - não me passando sequer pela cabeça que navegava, sobretudo, nos oceanos da Poesia.
Recordo bem o dia em que descobri os seus quadros. Tinha 15/16 anos. Visitando, em Portalegre, uma exposição de artistas alentejanos na encantadora galeria situada - estranha vizinhança... - entre a igreja do Espírito Santo e os sanitários públicos, fui encontrar duas obras que me tocaram particularmente, pela sua estranheza, pela sua capacidade de penetração, através das cores e dos traços, na Alma humana. Uma das pinturas tinha o vidro partido, colado com fita-cola, o que lhe dava um interessante aspecto subversivo, no meio de alguns óleos com farpela lustrosa, mas com corpo mal-asado.
Quando, mais tarde, comecei a conhecer a obra escrita de Nicolau Saião, foi-se desenhando uma convicção que não mais deixei (e tenho aprofundado): a sua pintura é inseparável da sua poesia. Criação plástica e criação verbal são duas vertentes da mesma montanha, de que fazem parte também as suas crónicas e os seus ensaios (felizmente) heterodoxos, tábuas diversas de um retábulo ainda em crescimento.
Surrealista na melhor acepção da palavra, Nicolau Saião vem construindo há mais de trinta anos uma obra plástica dotada de coerência assinalável. Sem se revestir de monotonia, vai tocando diversas técnicas de expressão e múltiplas formas de representação, para melhor interpretar as imagens interiores e exteriores que a dominam. Chamo-lhe "surrealista" não apenas por ter integrado o movimento logo no início dos anos '70. Fugindo deliberadamente do catecismo banal que muitos epígonos vão imitando com maior ou menor técnica, os quadros de Nicolau assumem aquilo que, de melhor, o verdadeiro Surrealismo nos tem trazido: a libertação total do ser humano e a abertura dos seus olhos a um Universo cheio de maravilha, mesmo quando as sombras desejam obscurecê-lo.
Dramaturgo com obra publicada (ignorada pela companhia portalegrense - o que se lamenta...), autor da poesia intensa d' Os Objectos Inquietantes, de Flauta de Pan e d'Os Olhares Perdidos - Nicolau Saião parece querer corporizar, também na pintura, "a grande aventura" que, segundo Fernando Batalha, no nosso interior "se desenrola".
Com uma liberdade notável, tem construído centenas (milhares?) de obras que combinam - com sabedoria - a nostalgia e o encantamento, imagens vindas da infância com o nojo da hipocrisia social, ironia e sarcasmo com uma religiosidade que tantas vezes timidamente assoma. Traço e cor reúnem-se para elevar formas mais ou menos nítidas, retratos mais ou menos claros - elementos que ultrapassam a representação do real para criarem outra realidade, inquietante e misteriosa.
Desassossega-nos, a sua pintura. Com uma figuração internamente multiplicada, com paisagens povoadas por pequenos seres e por pequenas coisas, faz-nos sentir estrangeiros neste mundo de onde se vai ausentando o maravilhoso, que ela contém na sua plenitude.
Abstraccionista e/ou trabalhador incansável de um figurativismo que atrai quem se aproxima sem preconceitos - creio não errar se afirmar que (mesmo fora dos circuitos comerciais) a pintura de Nicolau Saião será reconhecida pela sua inegável originalidade (reconhecimento que já começa a desenhar-se, em benefício da Arte portuguesa).

(Ruy Ventura)

27.1.05

Cimbalino Curto #140



Depois do celebradíssimo Desfile de Pais Natal, que resultou num dos melhores momentos televisivos de 2004, e do estrondoso sucesso das Olimpíadas da Columbofilia, eis que o Porto é de novo o palco de outro grande acontecimento internacional, que irá honrar o país e assombrar o mundo. Senhoras e senhores, meninas e meninos, a Câmara do Porto apresenta - ó, a glória! - o Maior Desfile do Mundo de Carros de Bombeiros. Terá lugar em Maio e a organização, trémula de excitação, promete "colorir a cidade" com "milhares de carros", contrariando assim o falso ambiente de crise que se vive na cidade e calando de vez os eternos profetas da desgraça.
Ora, como fica demonstrado, este executivo não brinca em serviço. E, por isso, creio, já estará a estudar alternativas para outros eventos a realizar depois de Maio. Nós, neste blogue, estamos solidários com o esforço da câmara e queremos contribuir com algumas ideias. Para isso, contamos também com a colaboração e criatividade dos nossos leitores. Deixem, por favor, as vossas sugestões de eventos na caixa de comentários ou enviem-nas para o nosso mail quartzo@sapo.pt.

Nota importante: não serão aceites propostas de campeonatos internacionais de sameirinha ou grandes prémios do mundo de corridas de rãs, por falta de originalidade.

26.1.05

Post It #250

Para saber qual é o dia mais deprimente do ano, basta fazer as contas:

[W + (D-d)] x TQ
-----------------
M x NA

Cimbalino Curto #139



Ainda a propósito dos números espectaculares de Serralves, o Serafim levanta o problema de saber se a maioria dos visitantes será do Porto. "Não será que Serralves continua a ser estranha aos portuenses?" Parece-me evidente que só uma leitura muito ingénua destes números nos poderia fazer supor que Serralves reflecte os gostos e interesses culturais do portuense médio. E reconheço que uma parte importante dos visitantes, com os portuenses à cabeça, rumam a Serralves por motivos exteriores ao interesse substantivo pela arte. Serralves vende muito bem o seu produto, é capaz de criar modas, necessidades, expectativas e até delírios colectivos (os últimos dias da exposição de Paula Rego é um bom exemplo disso mesmo), graças a um excelente trabalho de promoção e marketing que envolve suportes publicitários convencionais, e os próprios meios de informação. Nesse sentido, Serralves corresponde também a uma espécie de cultura de consumo rápido, de fachada, sem substância. Há pessoas que vão a Serralves como vão ao Shopping (basta pensar nas intermináveis vagas de visitantes aos domingos de manhã). Mas qual é o mal? O gosto pela arte cultiva-se como se cultiva outra coisa qualquer. E tem que se começar por algum lado. E esse "algum lado", no Porto, é Serralves. O único senão é que há apenas Serralves. Mais importante do que saber o número exacto de portuenses que vão ao museu, é perceber que Serralves criou na cidade um ambiente muito favorável ao gosto pela arte, uma espécie de efervescência em torno da arte. Por isso, o museu está a contribuir para nivelar por cima a cultura dos portuenses. Mesmo que isso não seja imediatamente visível.

Post It #249

João Serenus é quem diz.

Señor Tallon #95

PROVÉRBIOS PARA OS DIAS DE HOJE

"Se os contabilistas se põem a fazer guerras, deviam calcular também as probabilidades."

Apenas uma sugestão para juntar aos provérbios elencados por Pacheco Pereira.

25.1.05

Post Scriptum # 470

O HOMEM E SUA SOMBRA - 4

Um homem deixou de alimentar
a sombra que carregava. Alegou razões de economia.
Afinal para quê de sobejo levar algo que o duplicava?

Sem sombra, pensou
melhor carregaria o que nele carregava.

Equivocou-se. Definhou.
Descobriu, então, que a sombra o sustentava.

Affonso Romano de Sant'anna
No suplemento literário do jornal Globo, esta semana (registo gratuito mas obrigatório).

Post Scriptum # 469



Página de "Sexo, Noitadas & Rock'n'Roll", de António Pedro Ribeiro. Um livro que aguarda homologação da Senhora Ministra da Cultura, nos termos da lei.
(Pedidos para apedroribeiro@hotmail.com)

Cimbalino Curto #138



A Administração do Museu de Serralves fez ontem um balanço da sua actividade durante 2004, apresentando mais alguns dados interessantes sobre a afluência de visitantes ao museu do Porto. Se me permitem, e à boleia destes dados, gostava de retomar o tema do papel da Cultura para a projecção e desenvolvimento do Porto. Ou, utilizando uma expressão cara aos nossos contabilistas oficiais, como uma "mais-valia do ponto de vista da economia da cidade".
De acordo com os responsáveis do museu, Serralves recebeu em 2004 a visita de 330.525 pessoas, as actividades do serviço educativo envolveram cerca de 98.578 participantes, 2600 participaram em visitas guiadas, e 28.371 em visitas escolares. A iniciativa "Serralves em Festa", que assinalou o 5º aniversário do museu, recebeu 42.000 visitantes, e, na área da divulgação, foram distribuídas 400.000 "newsletters" e houve 10.000.000 de visitas ao seu sítio na internet. Desnecessário será dizer que Serralves foi o museu mais visitado em Portugal e um dos que mais cresceu na Europa.
Tudo isto numa cidade onde a Cultura é entendida pelos seus principais representantes políticos como uma dimensão menor da vida pública. Tudo isto numa cidade onde a cartilha oficial reproduz o velho lugar comum de que arte não gera riqueza. A verdade é que, se excluirmos o futebol, nenhuma outra iniciativa ou instituição atraiu tantos visitantes ao Porto, nos últimos anos, como as exposições de arte de Serralves. E se somarmos a estes, os visitantes da Capital Europeia da Cultura, o cenário é ainda mais esclarecedor. Ou seja, uma parte muito importante do turismo que rumou ao Porto teve por motivação - ó céus! que horror! - a Cultura.
De qualquer maneira, ainda acredito que há situações que podem fazer o mais impenitente dos contabilistas reflectir sobre o valor de certos números com menos preconceitos.

Post Scriptum #467



Joaquín O. Giannuzzi
(Argentina, 1924-2004)

A HASTE CAÍDA

Uma rajada de vento quebrou
a haste do gladíolo vermelho.
Tombado junto à cerca de arame
é como um braço vencido por um súbito cansaço.
Em volta a paisagem observa
o seu próprio esplendor verde depois da chuva.
A flor vermelha esmorece
sob a intensidade do sol
e o caule extingue-se de volta à terra.
Sabemos vagamente como tudo isto acontece,
ébrios de identidade e permanência:
em poucos dias completar-se-á a dissolução.
Mas lenta é a morte
por dentro deste fim que acabaremos por esquecer.

LA RAMA CAÍDA:
Una ráfaga de viento ha quebrado/ la rama del gladiolo bermejo./ Caída junto a la cerca de alambre/ es como un brazo vencido por una brusca fatiga./ En el vasto entorno, el paisaje atiende/ a su propio verdor creado por la lluvia./ Ahora, la intensidad del sol/ marchita el bermejo hacia un marrón reseco/ y el tallo oscurece adherido a la tierra./ Muy vagamente sabemos por qué sucede esto ante nosotros/ ebrios de identidad y permanencia:/ unos pocos días consumarán la disolución/ pero lenta es la muerte/ en este final que olvidaremos.


A tradução, talvez demasiado livre, é minha. Mais poemas de Giannuzzi aqui.

24.1.05

Post Scriptum #466 ter

O Rui Manuel Amaral falou num comentário dum professor de literatura que inventou um programa para fazer poemas. Seria este o professor?

Se sim, então uma das versões do programa é esta.

Post Scriptum #466 bis

Livro de Leitura da 4a. Classe, 1961

"A terra precisa de ser cortada profundamente pela charrua, abundantemente adubada e limpa das ervas daninhas, que prejudicam as sementeiras.

Todo o esforço feito pelo homem, para obrigar a produzir a terra, não é uma tarefa de escravo, mas um trabalho útil, que será generosamente recompensado." (Sublinhado nosso).

E Salazar continuou a obra de Deus.

Post Scriptum #466

Génesis 1, 26

26 Então Deus disse: «Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele domine os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra». 27 E Deus criou o homem à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou; e os criou homem e mulher. 28 E Deus os abençoou e lhes disse: «Sejam fecundos, multipliquem-se, encham e submetam a terra; dominem os peixes do mar, as aves do céu e todos os seres vivos que rastejam sobre a terra». 29 E Deus disse: «Vejam! Eu entrego a vocês todas as ervas que produzem semente e estão sobre toda a terra, e todas as árvores em que frutos que dão semente: tudo isso será alimento para vocês. 30 E para todas as feras, para todas as aves do céu e para todos os seres que rastejam sobre a terra e nos quais respiração de vida, eu dou a relva como alimento». E assim se fez. 31 E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo era muito bom. Houve uma tarde e uma manhã: foi o sexto dia.

Deus começou muito mal.

Post Scriptum # 465

24 de Janeiro de 1938.

No fundo, não procuro outra coisa na vida a não ser as provas para lhe poder chamar "vaca". (...)
Se fosse diferente, é que nos devíamos espantar: acumulamos, acumulamos raivas, humilhações, ferocidades, angústias, lágrimas, diabetes, uma esclerose que nos aniquila. E pronto.

Cesare Pavese, O Ofício de Viver.

A Gêrencia recomenda.



A partir de hoje, no Instituto Politécnico de Portalegre.

Cimbalino Curto #137



A exposição de Paula Rego, em Serralves, recebeu a visita de cerca de 160.000 pessoas. Muitas das quais vindas do exterior do Porto. Um dado que talvez merecesse - talvez - uma pequena reflexão por parte dos nossos grandes contabilistas locais e especialistas em números e orçamentos.

O Silêncio É de Ouro #188



Efeito Guronsan para manhãs de segunda-feira.

21.1.05

Cimbalino Curto #136

Tenho que admitir que o Manuel tem razão. Perante as provas que apresenta, sou obrigado a vergar-me e, com toda a humildade, reconhecer que fomos injustos no julgamento que fizemos do trabalho da Câmara do Porto na área da Cultura. Mas quem nunca acusou, quem nunca injuriou sem motivo? Por isso, quero aproveitar este post para me desculpar e apresentar a prova definitiva de que esta Câmara está efectivamente empenhada na promoção das belas artes: este é o primeiro executivo na história da cidade composto exclusivamente por artistas. Sim, e artistas da mais alta craveira. E só uma "venda bem presa e bem escura nos olhos", como bem lembrou recentemente o presidente Rio , nos impediu de ver isto durante tanto tempo.
Repare-se, por exemplo, na arte do vereador Paulo Cutileiro, que aposta numa mistura original de pequenos fragmentos da realidade com material anedótico. Citemos o repórter do Comércio do Porto que ontem testemunhou a mais recente performance do artista Cutileiro: "Paulo Cutileiro, que falava durante uma visita ao local [das XXIX Olimpíadas da Columbofilia, a decorrer no edifício da Alfândega], disse que a Câmara do Porto pretende que a prática da columbofilia extravase a dimensão familiar. Nesse sentido, anunciou a criação de dois pombais em escolas básicas da cidade. O autarca considera que o contacto com os pombos-correio desperta 'atitudes positivas e comportamentos relevantes'." Mais: Cutileiro classificou ainda as XXIX Olimpíadas da Columbofilia, como uma "mais-valia do ponto de vista da economia da cidade".
Dito isto, calo-me de vez.

Umbigo #131

"Faça-me o favor de me dar algum assunto, engraçado ou não, uma anedota, um gracejo, um quiproquó... Faça-me esse favor, dê-me um assunto. Far-lhe-ei imediatamente um post de dez ou vinte linhas, e ele será, juro-lhe, um dos mais divertidos."
Carta de Gogol para Puchkine, 1835.

"Pede sobretudo ao Annenkov que me escreva. Ele tem matéria para o fazer, certamente que se passou alguma anedota na Câmara do Porto."
Carta de Prokopovitch para Gogol, 1837.

Post It #248

Emanuel Félix comenta Lyndon Johnson.

20.1.05

Post It #247



[Via Hotel Sossego]

Post Scriptum # 464

"(...) uno escribe, otro imprime, otro lee, otro comenta, otro recomienda, otro lee el comentario y busca el libro, y lee el libro con el comentario en la cabeza, otro lee a otro autor y relaciona las lecturas, otro lee y a su vez escribe, otro se pregunta cómo será escribir a orillas del Gualeguay y escribe a orillas del Napostá, otro mira por la ventana y escribe y lee el diario y relaciona las lecturas, otro alza un dedo docto y determina que eso de leer el diario y relacionarlo con la Obra Literaria no tiene nada que ver con nada, otro le dice 'callate, salame', otro responde que 'salame' no es una palabra con pedigree literario y que mejor no usarla, otro dice que sí, que major usar todo, otro hace cosas que no son ni escribir ni leer pero que no las haría si no hubiese escrito, si no hubiese leído (...)"

Excerto de um press-release da Cooperativa Editora El Calamar, de Buenos Aires.

Post It #246



The greatest essay on Oedipus ever written.

O Povo é Sereno # 203

"O professor [do curso de História da Faculdade de Letras do Porto] Ribeiro da Silva comparou aos actuais governantes os antigos senhores da Idade Média das terras de Santa Maria, e de Portugal, que apenas recebiam os impostos do povo para o defender das pestes e da guerra. Durante um painel de discussão intitulado 'Fome, Peste e Guerra: Há 500 anos - S. Sebastião intercessor -Que movimentações? Hoje, que caminhos?', realizado anteontem em Santa Maria da Feira [no âmbito das comemorações dos 500 anos da festa das fogaceiras], o professor, comparando a época medieval com a contemporânea, afirmou que era preciso outro reinado dos Filipes para pôr ordem no país. 'Na altura vieram os Filipes e puseram isto na ordem. Não sei se não será preciso virem outros Filipes para pôr tudo na ordem', afirmou."

Talvez o patrão da Zara esteja disponível.

19.1.05

O Povo é Sereno # 202

Sai mais uma guerra para a mesa do canto.

Cimbalino Curto #135

Hoje chega-nos a notícia de que o Porto é, por este dias, o palco privilegiado de um dos principais eventos desportivos do mundo. A partir de hoje e até domingo, a cidade recebe as XXIX Olímpiadas da Columbofilia, que irão colocar em competição cerca de 800 pombos, provenientes de 32 países.
Não queremos dar largas ao sentimento e não é nosso hábito embandeirar em arco. Mas lemos isto e de imediato a nossa imaginação agita-se, o nosso orgulho bairrista inflama-se, a nossa esperança renasce. O Porto está definitivamente na rota dos grandes acontecimentos internacionais.
Sempre gostava de ver a cara dos parisienses, berlinenses e londrinos quando souberem disto.

O Sal da Língua



Escuta, escuta: tenho ainda
uma coisa a dizer.
Não é importante, eu sei, não vai
salvar o mundo, não mudará
a vida de ninguém - mas quem
é hoje capaz de salvar o mundo
ou apenas mudar o sentido
da vida de alguém?
Escuta-me, não te demoro.
É coisa pouca, como a chuvinha
que vem vindo devagar.
São três, quatro palavras, pouco
mais. Palavras que te quero confiar,
para que não se extinga o seu lume,
o seu lume breve.
Palavras que muito amei,
que talvez ame ainda.
Elas são a casa, o sal da língua.

Eugénio de Andrade nasceu a 19 de Janeiro de 1923. O aniversário será assinalado através de uma discreta sessão com Manuel António Pina e o lançamento da revista Textos e Pretextos, dedicada ao escritor. Esta noite, na Fundação Eugénio de Andrade (Passeio Alegre, no Porto).

Ilha dos Amores # 122


Yousef Karsh, "Zulu: Ulla Jacobsson, with Extras", 1963.
(Fotografia realizada durante a rodagem de Zulu, filme de Cy Endfield, estreado em 1964.)

18.1.05

Señor Tallon #94

Um poema só é bom enquanto não sabemos quem foi que o escreveu.

Post Scriptum # 460



Dizem que não há amor como o primeiro. E eu concordo. Este foi o meu primeiro Dom Quixote. Adquirido há muitos anos no Candelabro, o alfarrabista do largo mais bonito da Baixa do Porto, o Largo Mompilher.

"Numa aldeia da Mancha, de cujo nome não quero lembrar-me, vivia, não há muito tempo, um fidalgo dos de lança velha, escudo ferrugento, cavalicoque magro e galgo corredor. (...)
O nosso fidalgo roçava pelos cinquenta anos. Era robusto, seco, de rosto magro, muito madrugador e caçador entusiasta. Conta-se que tinha o sobrenome de Quijada ou Quesada, mas as opiniões divergem. Afigura-se mais verosímil que se chamava Quinjana. Porém, isto pouco importa: basta que os factos relatados sejam verdadeiros.
Quando este fidalgo tinha intervalos de ócio (o que sucedia todo o ano), entregava-se à leitura de livros de cavalaria, com tanto gosto e apego que se esqueceu da caça e da administração dos seus bens. (...)
Em suma, tanto se enfrascou D. Quixote naquelas leituras, que passava a noite a ler, do sol-posto até madrugada, e os dias, de manhã à tarde. E assim, de pouco dormir e muito ler, se lhe secou o cérebro, perdendo o juízo. Aquela pobre cabeça encheu-se de encantamentos, batalhas, desafios, amores, tormentos e todas as demais loucuras que lia nos livros. Para ele não havia neste mundo histórias mais verdadeiras."

É o volume XVI da "Biblioteca dos Rapazes", da Portugália. A tradução e adaptação é de Maria Ponce. A fazer fé num pequeno selo que se encontra no verso da capa, o livro foi vendido, pela primeira vez, numa livraria de Guimarães, L. Oliveira & C.ª (Rua da Rainha D. Maria II, 13). E, na folha de rosto, há uma assinatura que suponho terá sido escrita pela anterior proprietária: Helena Maria Brochado Ribeiro da Costa.

O Povo é Sereno # 201

Ping

Pong

Ping

Pong

Piiiiiing


(Do Público de ontem.)

17.1.05

Post It #245



[Via Hotel Sossego]

Señor Tallon #93

Separados à nascença.



Ferreira de Castro, cerca de 1930 | José Castelo Branco, 2004.

Ilha dos Amores # 121


Virgem com o Menino,
Oficina do Espinheiro (Frei Carlos), c. 1520.


Na escola, a minha geração aprendeu que a pintura portuguesa do Renascimento tinha sido pouco mais do que banal. Uma espécie de parente pobre e envergonhado da grande arte da Renascença italiana e nórdica. Vasco Fernandes (Grão Vasco) seria apenas uma excepção que servia para confirmar a regra. A realidade, como é óbvio, é bem mais complexa do que isto. E a pequena exposição que está actualmente patente no Museu Soares dos Reis (a página não está actualizada), no Porto, mostra justamente que a arte portuguesa de quinhentos foi muito mais interessante do que os velhos estereótipos deixam entrever.
A exposição, intitulada "Cores, Figura e Luz - Pintura Portuguesa do Século XVI", reúne obras de Frei Carlos, Mestre da Lourinhã, Garcia Fernandes, Cristóvão de Figueiredo, Vasco Fernandes, Gaspar Vaz, Gregório Lopes e Francisco de Campos, algumas das quais pertencentes à colecção do museu do Porto e que normalmente não estão acessíveis ao público. Absolutamente a não perder (ao domingo de manhã a entrada é livre).

O Silêncio É de Ouro #185



Efeito Guronsan para manhãs de segunda-feira.

14.1.05

Post Scriptum # 458

Mas os verdadeiros viajantes são aqueles que partem/ por partir; corações ligeiros, semelhantes a globos,/ da sua fatalidade jamais escapam,/ e, sem saber porquê, dizem sempre: vamos!

Baudelaire, "Poema CXXVI - A Viagem", de "As Flores do Mal".

Post Scriptum # 457



13 de Janeiro de 1949.

Desencanto perante o já feito, perante as opera omnia. Impressão de estar doente, de decadência física. Curva em declínio. E a vida, os amores, onde estão? Conservo certo optimismo: não acuso a vida, acho que o mundo é belo e digno. Declínio. O que fiz, fiz. Como é possível? Ambição, desejo ardente, ansiosa carência de agarrar, morder, fazer. Chegarei ainda a tal?
(Tudo isto porque chovem os juízos negativos sobre "O Diabo sobre as Colinas".)

Cesare Pavese, O Ofício de Viver.

Post It #244

"Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipisicing elit, sed do eiusmod tempor incididunt ut labore et dolore magna aliqua. (...)"

Este é um dos textos mais lidos por editores, impressores, publicitários e designers, desde sempre e em todo o mundo. É conhecido, na gíria das artes gráficas, por "texto simulado". Mas, afinal, de simulado tem muito pouco.

Post It #243



Let's not kid ourselves: everyone hates translations. The evidence is everywhere in the history of literature. Cervantes wrote that reading a translation was "like looking at the Flanders tapestries from behind: although you can see the basic shapes, they are so filled with threads that you cannot fathom their original luster. "Goethe took issue with translators themselves, whom he likened to "enthusiastic matchmakers singing the praises of some half-naked young beauty: they awaken in us an irresistible urge to see the real thing with our own eyes. "Gide observed that the translator was "a horseman who tries to put his steed through paces for which it is not built." Madame de Lafayette equated the translator with "a lackey whose mistress sends him to pay someone a compliment; whatever she said politely, he renders rude.

Excelente texto de Wyatt Mason, a propósito das novas traduções de Proust surgidas recentemente nos Estados Unidos.

13.1.05

Post Scriptum # 456

Uma lady na mesa, uma louca na cama.
Marco Paulo, Taras e Manias.

Muitas coisas que à mesa revelam mau gosto são na cama um bom condimento. E vice-versa. A maior parte das uniões são assim infelizes pela simples razão de não se proceder a esta separação entre cama e mesa.
Karl Kraus, O Apocalipse Estável.

O Blogue é de Ouro



UM ANO COM LETRA GRANDE.

Post Scriptum # 454

13 de Janeiro de 1949.

Viver entre as pessoas é sentirmo-nos como folha ao vento. Vem a necessidade de isolar-se, de fugir ao determinismo de todas aquelas bolas de bilhar.

Cesare Pavese, O Ofício de Viver.

Umbigo #129

Ljogkim zefirom letit.

O Povo é Sereno # 199



OBRIGADO, DANIEL

Nunca, como hoje, se sofreu tanto para se ser neste país um professor exigente e consciencioso. A História da Educação em Portugal sempre foi feita de sobressaltos, de avanços e de recuos, de momentos de euforia e de desencanto, de manipulações subreptícias e de instrumentalizações descaradas - mas nunca, como hoje, o professor se viu no papel de bode expiatório dos males da Educação.
Numa sociedade ingénua que, a partir de 1974, não achou melhor maneira de reagir ao autoritarismo do que instituir um sistema educativo que consagra direitos sem obrigar ao respeito pelos deveres mais elementares, os professores têm sido vítimas de um país que os deseja sobre-humanos, que tudo lhes exige dando muito pouco em troca. Deixam de ensinar para serem burocratas, são estóicos perante as agressões (psicológicas, mas também físicas) de um número crescente de pais e de alunos, abdicam dos seus princípios para "concordarem" com um sistema educativo que não promove valores como o da exigência, engolem sapos perante um regime de avaliação que promove a preguiça e a estupidez, esquecem o que aprenderam para descerem até mínimos inaceitáveis o nível de exigência na aquisição dos conhecimentos, substituem o Estado como assistentes sociais quando têm nas suas turmas crianças pobres ou no limiar da pobreza, são psicólogos quando as escolas não os têm ao seu serviço, assumem o papel de pais e de mães quando estes "abandonam" os seus filhos na Escola, demitindo-se do seu papel de educadores... E, como se isto não bastasse, os professores deste país têm ainda que ser surdos quando escutam os palpites de "especialistas" míopes ou interesseiros, quando ouvem - da boca de gente que não conhece a realidade de uma escola básica ou secundária - que "trabalham pouco", que "gozam muitas férias", que "ganham bem e saem cedo" (gente essa que esquece o facto de os docentes serem os pacientes mais assíduos de psicólogos e de psiquiatras).
Por tudo quanto escrevo, fiquei comovido quando li a crónica de Daniel Sampaio, dada à estampa no dia 8 de Janeiro na revista "Xis". Nada do que afirmou era para mim novidade. Mas vê-lo escrito como o escreveu confortou-me - na medida em que abriu uma centelha de esperança para todas as pessoas de bem que tiveram oportunidade de ler o artigo. O reconhecimento público do desrespeito de que têm sido alvo os professores e um Ensino rigoroso nos últimos decénios é meio caminho para a construção de um sistema educativo em que o trabalho dos bons docentes seja reconhecido, em que os profissionais menos competentes sejam incentivados a melhorar a sua prática, em que se promova um verdadeiro sucesso educativo (e não um insucesso camuflado) baseado numa relação sã entre docentes, alunos, pais e comunidade envolvente.
Daniel Sampaio propõe: "neste novo ano, (...) pensemos o que poderemos fazer pelos professores, em vez de estarmos sempre a exigir o que eles devem fazer pelos nossos filhos".
Por estas e por todas as palavras do seu artigo, respondo - comovido - de forma simples, mas sentida: - Obrigado, Daniel!

(Ruy Ventura)

12.1.05

Post Scriptum # 453



Boujema El Aoufi
(Marrocos, n. 1961)

O SONHO DO POEMA

Por duas razões que resistem à especulação
O poema recolhe-se cedo
Ao corpo do poeta:
Ou porque o poema se priva de sonhar
Ou porque o guerreiro
Decidiu descansar!
Apenas entre mãos sonhadoras o poema dorme na posição correcta!

Tradução de Pedro Amaral, a partir da versão inglesa, de Norddine Zouitni.

Cimbalino Curto #134

O acontecimento mais importante da semana cultural portuense terá lugar hoje, no edifício da Câmara Municipal. Mário Cláudio, Prémio Pessoa 2004, vai ser recebido na Sala Dona Maria, pelo presidente da autarquia, Rui Rio, num encontro que se adivinha intelectualmente muito estimulante. Recorde-se que a separar as duas personalidades estão as suas opiniões divergentes no que respeita à gestão autárquica protagonizada pelo dirigente do PSD, em especial na área da cultura. Mário Cláudio considerou recentemente que, em três anos, o autarca "dinamizou a cidade, do ponto de vista cultural". Rui Rio, pelo contrário, considera que, ao fim de três anos, "a cidade está mais dinâmica, do ponto de vista cultural". Infelizmente, o acesso ao espectáculo só é possível com convite.

Post Scriptum # 452



"Sexo, Noitadas e Rock'n'Roll", de António Pedro Ribeiro.
Um livro de poemas e outros escritos que revelam uma lamentável falta de sentido de Estado.
(Pedidos para apedroribeiro@hotmail.com).

11.1.05

Post Scriptum # 450

11 de Janeiro de 1940.

As grandes florações [literárias] são precedidas por uma geração de intensos tradutores (neòteroi, stillnovistas, elisabetianos, trio da dor, romance russo, neo-realismo americano).
Quanto mais a história se avizinha da nossa época, mais frequentemente se dá a fusão entre duas civilizações através do papel, e não pela carne. As traduções substituem as invasões.

Cesare Pavese, O Ofício de Viver.

Ilha dos Amores # 120


Zhang Huan, Family Tree, 2000.

I invited 3 calligraphers to write texts on my face from early morning until night. I told them what they should write and to always keep a serious attitude when writing the texts even when my face turns to dark. My face followed the daylight till it slowly darkened.
(Zhang Huan)

Cimbalino Curto #133

"Interviemos de forma contundente no Bairro S. João de Deus [considerado o maior 'supermercado' de drogas do país], que constituía e, em parte, ainda constitui a maior chaga social da nossa cidade, pela miséria e pelo sofrimento humano que ali, vergonhosamente, se tinha instalado."
(Rui Rio, na sessão comemorativa que assinalou os seus três anos de mandato à frente da Câmara do Porto).

"Com a demolição de casas [em S. João de Deus] os principais problemas do bairro não foram resolvidos, mas sim agravados e estendidos a outros bairros."
(Padre José Maia, presidente da Fundação Filos e responsável por múltiplos projectos de apoio social no Bairro S. João de Deus, em curso há mais de duas décadas).

10.1.05

Umbigo #127

O papel rosado dos jornais de economia é péssimo para acender o lume nas lareiras e salamandras domésticas.
Em compensação, os suplementos literários oferecem uma chama intensa e abundante, que se propaga rápida e facilmente de linha para linha.

Post Scriptum # 448



Carl Sandburg
(E.U.A, 1878-1967)

SOPA

Vi um homem famoso comer sopa.
Vi que levava à boca o gorduroso caldo
com uma colher.
Todos os dias o seu nome aparecia nos jornais
em grandes parangonas
e milhares de pessoas era dele que falavam.
Mas quando o vi,
estava sentado, com o queixo enfiado no prato,
e levava a sopa à boca
com uma colher.

Tradução de Alexandre O'Neill.
Carl Sandburg, "Antologia poética", Tempo, 1962.

Poema enviado pela Amélia Pais.

Umbigo #126



Efeito Guronsan para manhãs de segunda-feira.

Cimbalino Curto #132



Lamento, mas não consegui resistir. Esta esclarecedora imagem do fotógrafo Jonas Batista saiu no Público de domingo e foi captada na cerimónia que assinalou os três anos de mandato de Rui Rio à frente da Câmara do Porto. Dadas as circunstâncias, era difícil encontrar uma imagem mais "mediaticamente incorrecta", para usar uma expressão do próprio Rio.

7.1.05

Post Scriptum # 447



Uma excelente notícia. Finalmente, a Assírio & Alvim anuncia a edição para breve de uma antologia de Ezra Pound. Por estranho que pareça, desde 1986, ano em que a D. Quixote editou a excelente antologia de José Palla e Carmo - estando, obviamente, desde há largos anos, esgotada -, que não há uma verdadeira recolha de poesia de Pound disponível no mercado português (para além das edições brasileiras). Muito antes surgira a memorável "Antologia Poética" do brasileiro Augusto de Campos, lançada no princípio dos anos 50 pela Ulisseia, hoje encontrando-se apenas em certos alfarrabistas e a um preço, pelo menos para mim, muito pouco convidativo.

Outros livros portugueses com alguns poemas ou versões de Ezra Pound:
Fim do Tormento/ O Livro de Hilda.
Do Caos a Ordem.
Cathay.

Cimbalino Curto #130

No entanto, Manuel, há um pormenor no texto do Comércio do Porto de ontem, dedicado à entusiástica visita de José Castelo Branco ao Bolhão, que também merece ser sublinhado.
A páginas tantas, escreve o repórter: "Mas nem todos gostaram da visita. Joaquim Ferreira, merceeiro, mostrou-se indignado: 'O povo português é otário! O que é que ele é?'"
Mas há mais. O repórter refere ainda que Castelo Branco, não fosse o diabo - que também é tripeiro - tecê-las, "fez-se acompanhar de seguranças". Para mim, são provas mais do que suficientes de que ainda há esperança para a cidade.

6.1.05

Post It #242

Dúvidas sexuais e outras coisas que tais? Saiba como fazê-lo.

Post It #241

"The Top 25 Censored Media Stories of 2003-2004", apresentado pela organização Project Censored.

O Povo é Sereno # 198



A cruel moda das facadas nas costas, estalos na cara e pontapés no rabo continua a provocar vítimas. E as vítimas de ontem são os algozes de hoje. E os algozes de hoje serão as vítimas de amanhã, e por aí fora. Felizmente, há os faqueiros do Jornal de Notícias para alimentar este novo e promissor mercado emergente.

5.1.05

Post Scriptum # 446

Pertenço a um género de portugueses/ Que depois de estar a Índia descoberta/ Ficaram sem trabalho. A morte é certa./ Tenho pensado nisto muitas vezes.

(Álvaro de Campos)

Umbigo #125

Deus morreu.
Assinado: Nietzsche

Nietzsche morreu.
Assinado: Deus

(Grafiti, 1968)

Basta!

O PORTO NÃO É ISTO. ISTO NÃO É O PORTO. BASTA, PORRA!

Ilha dos Amores # 119



Camille Pissarro, "Gelee blanche", 1873.

Post Scriptum # 445



- Que manhã tão feia! Como dormiu a noite, tio?
- Ramesh Babu - replicou o tio -, nesta idade em que estou, resolvi muitos problemas, e, embora eu tenha o ar de um velho maníaco, é raro não encontrar a chave de um enigma; mas você é, certamente, o mais difícil que se me deparou até hoje.
Ramesh corou, apesar de todos os esforços para se conservar sereno. Respondeu, sorrindo:
- E pensa que seja um crime insolúvel? Veja, por exemplo, uma língua tão barroca como é o telegu. Não é fácil mesmo aprender os seus rudimentos, e, contudo, uma criança telegu fala-a com as mesma facilidade com que pisca os olhos. É preciso não se apressar em condenar aquilo que não se compreende.

Rabrindanath Tagore, "O Naufrágio", Col. Prémio Nobel/DN.
Tradução de Telo de Mascarenhas.

4.1.05

Ilha dos Amores # 118



Imagem colhida aqui.

O Povo é Sereno # 197

Após ser eleito vai ocupar o lugar de deputado?
Na altura se verá. Se for importante e pensarem que seja necessário... Tudo depende das conversações que se vão seguir.

Qual é a sua vontade?
Tenho que ver as condições e por quanto tempo. Tenho a minha vida pessoal e não posso deixar de dar continuidade à minha empresa. Se tudo for conciliado, passar por uma plataforma de entendimento entre as partes, é uma possibilidade.

Há sempre figuras mediáticas que aparecem nas listas e depois nem pela Assembleia da República passam.
Quando as pessoas entram num projecto destes têm-no de fazer de corpo inteiro. Se assim não for é defraudar as expectativas nos eleitores. Os candidatos devem estar vinculados ao seu eleitorado.

Excerto de uma entrevista com o social-democrata Pôncio Monteiro, publicada hoje no Comércio do Porto.

Ilha dos Amores # 117



A Mondo Bizarre é um dos projectos mais notáveis do pequeno mundo editorial português. É uma revista maioritariamente dedicada às várias tendências da música moderna, com criticas de discos, entrevistas, sugestões de concertos, mas também referências a livros, BD, DVD, filmes. E tudo isto embrulhado num grafismo apetecível, inspirado no universo dos fanzines alternativos. A Mondo Bizarre é trimestral, tem cerca de 60 páginas, e, note-se, é totalmente grátis. Os textos são geralmente agradáveis e bem escritos.
No entanto, em alguns artigos ressoam os piores tiques e lugares comuns cultivados por uma boa parte da crítica musical portuguesa, a mesma que tem no Y uma espécie de livro de estilo. E esse é um irritante pormenor que não posso deixar de mencionar.
Eis alguns exemplos, retirados da edição de Setembro de 2004:

"Se algum dia tiverem o vosso neto sentado no colo e ele vos pedir que lhe contem uma história, não hesitem: a dos Guided By Voices consegue ser mais excitante que a do Capuchinho Vermelho."
(p. 16)

"Assim como a ave Fénix, que na mitologia grega merecia o título de animal mais raro da Terra, 'Miss Machine' dos norte-americanos Dillinger Escape Plan representa hoje a genialidade na sua forma mais intensa e insana."
(p. 24)

"De quando em vez a tinta negra sonega ao escriba a liberdade para continuar, mas o cárcere pode aumentar, se o repto for crivar pontos finais numa folha de papel cujo cabeçalho tenha Mark Lanegan dissolvido em maiúsculas."
(p. 33)

3.1.05

O Povo é Sereno # 196

Sou um frequentador habitual de duas bibliotecas públicas da área do Porto e recorro regulamente aos seus serviços de empréstimo domiciliário. E é com grande interesse que tenho seguido a discussão sobre o tema «pagamento de direitos de autor ao empréstimo de obras em bibliotecas», que o Jorge Vaz Nande e o Francisco José Viegas lançaram na blogosfera.
Concordo quando dizem que se trata de uma medida aceitável, uma vez que deve assistir ao autor o direito a uma compensação pelo empréstimo de um livro que é o resultado do seu trabalho (admito que, em teoria, um empréstimo possa representar menos um livro vendido). Mas também estou de acordo com a ideia, à qual sou muito mais sensível, de que esta regra constitui uma subversão da própria função, valores e natureza das bibliotecas públicas. E, tendo em conta a realidade portuguesa, o grau de perversidade desta medida é ainda mais elevado, como todos sabemos.
No entanto, e por mais que me esforce por contribuir com uma ideia séria para o debate, não consigo deixar de pensar que os autores que mais beneficiarão com isto são justamente aqueles que menos precisam de compensações desta natureza. Porque não tenhamos ilusões: os empréstimos das bibliotecas reproduzem fielmente os mecanismos e gostos dominantes no mercado. Ou seja, os grandes beneficiados serão todos os Dan Browns e Margaridas Rebelo Pinto deste pequeno mundo. Pelo contrário, os autores com menor vocação comercial, digamos assim, receberão uma pequena compensação quando o rei fizer anos. A não ser que passem a requisitar os seus próprios livros todos os dias e várias vezes por dia.
Pela minha parte, declaro, desde já, que estou disponível para ajudar autores desesperados. Em troca de uma pequena percentagem a combinar, posso requisitar qualquer livro, incluindo o "Manual de Electrónica", o "ABC da Criação de Periquitos" e as antologias de poesia da editora Minerva.
Já agora, e se estamos de acordo com o princípio do pagamento de direitos de autor no caso das leituras domiciliárias, também não seria justo aceitar o pagamento de compensações pela leitura dos livros nas bibliotecas?

Post Scriptum # 443

A MENTIRA DAS PERNAS CURTAS
(Erich Fried)

As
pernas
das
mentiras
maiores
não
são
sempre
tão
curtas
como
isso

Mais
curta
é
muitas
vezes
a
vida
daqueles
que acreditaram
nelas

"De Costas para a Janela - Poesia Alemã Contemporânea I", Col. Oiro do Dia, 1981. Tradução de João Barrento.

Mais Erich Fried neste blogue.

Umbigo #123

Efeito Gurosan para manhãs de segunda-feira.