29.4.04

O Povo é Sereno #89

Mais um contributo de Ruy Ventura, a propósito dos incontáveis pecados cometidos no restauro de arte sacra em Portugal.

Ao longo dos anos o restauro de obras de arte sacra tem estado entregue ao mais flagrante amadorismo (para mais não dizer). Exceptuando os monumentos intervencionados pelos organismos estatais (intervenção que, normalmente, só se realiza em edifícios classificados – em poucos, infelizmente), a maioria das peças tem sido entregue a gente oportunista ou simplesmente ignorante, devido a alguma miopia das autoridades eclesiásticas.
Claro está: há boas e más práticas. Dependentes do bom senso e do pulso dos bispos, traduzidos na capacidade de organizar bons departamentos de Arte Sacra e na firmeza perante a inconsciência dos párocos, das comissões fabriqueiras e das confrarias que pululam por esse país fora.
O melhor exemplo é o da diocese de Beja e do seu Departamento Histórico-Artístico, inteligentemente liderado por José António Falcão. Nela têm sido promovidos um inventário rigorosíssimo, restauros criteriosos e uma correcta divulgação das peças por esse país fora e por essa Europa adentro.
Maus exemplos há infelizmente muitos. Conheço vários e alguns gritantes. Apresento apenas um que conheço de perto: o da diocese de Portalegre, onde o responsável pela Arte Sacra aconselha os párocos a entregarem as peças a restaurar a santeiros bracarenses que, normalmente, as destroem irremediavelmente, pois nem sequer suspeitam o que é um restauro respeitador da verdade histórica do património.
Soluções? Uma possível é desatarmos a entupir o IPPAR com pedidos de classificação das peças que achemos significativas. Ou então tentar sensibilizar as autoridades eclesiásticas – na medida do possível… –, lutando contra a ignorância das populações que, habitualmente, acham “muito bonitas” as esculturas depois da “lavagem” efectuada pelas oficinas de Fátima e de Braga, alertando-as de que há instituições (como a Gulbenkian) que concedem subsídios para o restauro, desde que o mesmo seja feito por técnicos credenciados.


Ruy Ventura