Poemas de Oscar Wilde. Numa tradução inédita de Margarida Vale de Gato
Primeiro poema
Estas composições poéticas pouco conhecidas de Oscar Wilde (1854-1900) agrupam-se num conjunto de "impressões", que, derivadas de uma estética da sugestão cara ao simbolismo, se aproximam também da máxima do prefácio a O Retrato de Dorian Gray: "O que a arte espelha realmente é o espectador e não a vida." Assim, o movimento dos versos, encavalgado, transporta-nos nas pinceladas que não nos oferecem o quadro todo, mas pontos fugazes que estimulam a nossa imaginação da cena. É também notável o modo como nelas se procura o cruzamento plástico de várias sensibilidades artísticas, como a música, a pintura e as artes de decoração, inovando-se a técnica descritiva com efeitos que por vezes parecem prenunciar já o imagismo anglo-saxónico surgido na segunda metade do século XX.
Textos retirados da antologia Poems, a publicar em breve pela Relógio d'Água.
IMPRESSION DU MATIN
O Tamisa nocturno, azul e ouro,
Mudou-se em cinzenta Harmonia,
Uma barca de feno ocre
Desceu do cais, e, baça e fria,
A bruma amarela pousou
Em pontes, casas; de verdade
Eram como sombras; St. Paul
Era uma bolha na cidade.
Depois de repente o clangor
Do acordar; ruas trilhadas
De carroças; e no fulgor
Das telhas uma ave trinava.
Mas, branca e solitária, uma mulher,
Beijando-lhe a cabeça a luz desperta,
Bebia ainda o gás dos revérberos,
A boca como fogo, o coração de pedra.
Tradução e nota de Margarida Vale de Gato
4 Comments:
Não seria mais indicado que o nome da tradutora aparecesse mais discreto? Nada me move contra a senhora, mas francamente, tanto tropeço no gato já incomoda :)
Santos Leite
Caro Santos, a explicação é muito simples: a Margarida faz o favor de nos oferecer o seu trabalho (ainda inédito, diga-se). E se ler com atenção, reparará que não é um trabalho qualquer. E nós agradecemos a preferência e a simpatia. Se pudéssemos até fazíamos mais.
Gostei de ler e gostei de ver o destaque dado a quem vai permitindo que alguns se debrucem sobre estas preciosas palavras.
Muito bom, Margarida. Oscar Wilde é uma figura que sempre me interessou muito. E a sua tradução apanha muito bem a fina ironia dramática do nosso homem.
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