17.5.05

Um poema de Vicente Huidobro



A TEMPESTADE

a Max Jacob

Noite de temporal
a escuridão morde-me o crâneo.
Os diabos
postilhões do trovão
foram de férias.

Ninguém passou pela rua
Ela não veio
tombou na esquina
e o pêndulo
quedou-se imóvel
já não oscila.

Por vezes o eléctrico
afasta-se voando
como os passarocos de fogo.

Na montanha
os rebanhos
tremem sob o temporal
E o cão maneta que tudo vigia
procura a sua sombra.

Vem mais para o pé de mim
faremos uma viagem maravilhosa.

No deserto africano
as girafas buscam engolir a Lua.
Não é preciso olhar
obrigatório espreitar
por detrás dos muros.

E a curiosidade alonga o pescoço.

Alguém se procura
se procura
e ninguém topa o caminho.

Eu escondo uma recordação
mas eis que é inútil olhar os meus olhos.

Ao derredor do meu lar
o vento rosna
E talvez que lá ao fundo a minha mãe
soluce.

O berro dum trovão fatigado
seriíssimo pousou no cume mais altaneiro.


Vicente Huidobro. In "L'aventure Dada"

Nascido em Santiago do Chile (1889), faleceu em 1948. Figura de primeiro plano na intervenção dadaísta, editou também a revista "Creación", órgão do criacionismo que o teve como um dos inventores e principal animador. Autor, entre outros, de "Altaçor ou a viagem em paraquedas".

Imagem, tradução e nota de Nicolau Saião