1.3.05

Saramago troca caverna por barracão.

Domingo, horas de fazer horas antes de transmissão televisiva dos óscares. Passeio habitual até à livraria "Ponto de Encontro", no Saldanha Residence. Para dar os costumeiros dois dedos de conversa com os meus amigos livreiros.
A tertúlia foi parar ao livro "Leão", de Tolstoi, que mereceu honras de destaque como post do dia no blog de Rui Baptista (Amor-e-Ócio). Estava eu longe de imaginar o êxito da coisa. Infelizmente. Bom seria que a realidade da ignorância do povo não nos fornecesse de anedotas.
E as coisas vão muito mais longe do que aquilo que seria possível conjecturar. Cheguei a casa de "mala cheia", sem grandes esforço. Tudo episódios reais. Olhem só:
BERTRAND (Cascais): uma "tia" do mais "tia" que há, anda desesperada na livraria, a dessassossegar os livreiros, dando-lhes várias rodas de ignorantes e outros insultos sortidos. Ninguém conhecia a obra "O barracão", daquele que tinha vencido o Nobel pouco tempo antes.
- Mas não sabem quem é o Saramago?
Consolaram a senhora. Toda a gente sabia quem era o Saramago. As bases de dados é que desconheciam a obra "O barracão". Telefonemas para várias lojas e nada. A senhora muito nervosa.
Finalmente, um empregado resolveu arriscar, muito a medo:
- Tem a certeza de que é "O barracão"? Não será "A caverna"?
- Ou isso, ou isso... agora descubram-me lá o livro...
BERTRAND (Chiado): funcionário recém-chegado à livraria, muito bem intencionado, por certo, mas um pouco a rasar a literatura, arrumou "As rosas de Atacama" na secção de... Botânica. Lógica inatacável.
BERTRAND (Vasco da Gama): uma pessoa entra apressadíssima na livraria e dispara: "Tem o livro 'Tão veloz como o chocolate'".
PONTO DE ENCONTRO (Saldanha Residence): Não sabemos se Vitorino Nemésio se virou no túmulo, mas "As memórias de uma cadela pura" transformaram-se misericordiosamente em "Histórias de uma cadela safada". E "O Código Da Vinci" foi passar uma temporada com o Luís de Matos e transformou-se em "O Mistério Picasso".
EL CORTE INGLÉS: um sujeitinho (eu, por acaso) de volta do escaparate da BD. Depois, pergunta a um empregado: "Não tem 'Em busca do tempo perdido' de Proust"?.
O empregado, muito sorridente: "Isso é banda desenhada, não é?".
É, claro que é. Por que motivo não havia de ser?
Ainda há esperança?

Luís Graça