8.3.05

Os trovões luminosos de Jorge de Sousa Braga.



Se um número da revista "Relâmpago" é dedicado a Eugénio de Andrade, a decisão de o comprar toma-se num trovão. Como prémio por essa boa acção, descobre-se um belíssimo bónus no seu interior: poemas de Jorge de Sousa Braga. Poemas ou prosa (muito) poética, como lhe quiserem chamar. Aqui fica um exemplo, para perceberem melhor o que digo.

DE(LÍRIOS)

Em frente à casa amarela em Arles havia um canteiro
de lírios. Ou seria na cabeça amarela de Van Gogh que
esses lírios floresciam? Inclino-me mais pela segunda
hipótese. Ou não sofresse Van Gogh delírios.

de "O lírio que há no delírio"

Tenho um caso de paixão por Jorge de Sousa Braga desde que li uma crítica no "Expresso" sobre "De manhã vamos todos acordar com uma pérola no cu". Já passaram mais de 20 anos. No Verão de 1984 calcorreei as ruas de um sobe-e-desce coimbrão à procura da Tipografia Damasceno, em demanda de um tal Vasco Santos, da Fenda.
Desejava ardentemente comprar "A greve dos controladores de voo" e "Plano para salvar Veneza". Pequenos livrinhos. Grandes livrinhos. Dei com eles em Benfica, na Livraria Castil do CC Fonte Nova.
É frequente comprar vários exemplares de "O poeta nu" na Feira do Livro. É uma antologia com Sousa Braga (quase) de ponta a ponta. O mesmo Sousa Braga que Mário Viegas se comprazia em declamar no espectáculo "Portugal não, Europa nunca". Atacava com alma o poema "Portugal" (que não o de O'Neill) e depois desafiava a assistência: "Alguém sabe quem é este poeta?". Naquela noite estraguei-lhe os cálculos.
Vale a pena conhecer este médico que gosta de palavras concisas. Este cirurgião da poesia, que bisturiza os sentimentos e lhes prodigaliza pensos de ironia como se fosse possível curar a Humanidade das suas fraquezas.

Luís Graça