11.2.05

Post Scriptum # 485



Pinto. Rebelo Pinto. Margarida Rebelo Pinto.
Miss Pinto, para os amigos.
Escritora e missionária.
Ou melhor, missionária e escritora.
Eu não invento nada, por Toutatis! Está tudo na revista "Dinheiro", número 7, de Fevereiro de 2005. Miss Pinto é capa de revista sobre "cacaus" e outras minudências financeiras.
Diz ela a páginas 15, último parágrafo e vira a folha: "Queria quebrar barreiras, fazer algo de diferente, mas essencialmente ambicionava pôr as pessoas a ler. Principalmente a minha geração. Senti que essa era a minha missão".
E diz mais, muito mais. Volta atrás à página 15, se faz favor: "Um dia olhei para a minha vida e pensei: não é nada disto que desejo. Aos 40 anos ambiciono ter uma casa com jardim onde me possa sentar a escrever livros. Rodeada de cães e de crianças".
Permita-me um conselho, Miss Pinto, em nome das crianças: escolha Retrievers Doirados, são óptimos para as crianças. E não as ensine a ler directamente dos seus livros. Comece com Astérix, Tim-tim, depois Lucky Luke. Depois, serenamente, deixe-as descobrir o "Não há coincidências", uns números antigos das crónicas para a defunta "Se7e", uns números mais actuais da "Maxmen". Talvez mesmo das crónicas dominicais do "JN". É menos brusco.
Não caia na asneira de as ensinar a ler com "Alma de pássaro", enquanto rosna um Pittbull ou um Mastim Napolitano. É demasiado perigoso.
Resta-me descrever a capa da revista: Miss Pinto em estilo "heroin chic". Chic a valer, diria Dâmaso Salcede. "Fauteil" azul, a combinar com as riscas do vestido. Sapatos de camurça abiqueirada a condizer com o fundo da capa da revista. Abertura de pernas a cerca de 45 graus, sugerindo um triângulo isoscelamente escaleno. Cabelo cuidadosamente dialéctico: penteadamente despenteado. Tronco inclinado para a frente, numa posição de quem se dá ao "receptor imagético" da capa. Pequeno vislumbre dos seios reverente e levemente erótico, com um toque de tabasco utópico.
Olhar vidrado, como se tivesse a data do fuzilamento marcada. Olhar perdido no fado português. Olhar deprimido, como convém à literatura digna. Braços cruzados sobre as pernas, ao estilo de patas de Retriever doirado, deitado no jardim, rodeado de crianças, depois da brincadeira. Embora sem língua de fora.
Este é o meu olhar da capa. Nenhum olhar, diria o Peixoto.

Luís Graça