14.12.04

Post Scriptum # 427

QUE NEM GINJAS

Vai haver eleições? Ah pois vai! E já se sabe o dia, a hora e o minuto do mês - a consulta nas urnas vai mesmo suceder para grande gosto de uns e certo desespero de outros.
À guisa de reflexão filosófica, inteiramente manejável e muito maneirinha, talvez faça sentido dar a lume o poema de António Luís Moita, inédito ainda por cima, que nos dirige umas perguntas mesmo à mouche do alvo do meio do coração que qualquer ser votante possui no honrado peito democrático. É o

MONÓLOGO DO ELEITOR

Acabaram-se as Direitas?
Dissiparam-se no Centro?
Serão as Direitas feitas
de esquerdino movimento?

Sendo as Esquerdas sujeitas
ao mesmo vaivém do vento
vão, com as nuvens, direitas
à parte esquerda do Centro?

E o Centro? O que é o Centro?
Em que centro se situa?
No centro do Centro-Centro
de um satélite da lua?

É um Centro direitista
para a Esquerda cor-de-rosa?
Ou a tendência Sinistra
da Dextra silenciosa?

Que Centro é esse? Um sinal
de não comprometimento?
Ou, ao contrário, um invento:
manobra do Capital?

Será o Centro a Direita?
Fascismo com meiga fala?
Medo? Angústia? Um olho à espreita
com raiva de não ser bala?

E a Esquerda? O que é a Esquerda?
Dissiparam-se no Centro?
Serão as Direitas feitas
de esquerdino movimento?
retrocesso à burguesia?

E a esquerda Extrema-Esquerda
- a que tudo desagrega -
o que será quando vemos
que a Direita se lhe pega?

Será mesmo Extrema-Esquerda
a pedir terra queimada?
Ou um braço que a Direita
manipula encapuçada?

Será cravo de pureza
ou goivo de gula grada?
Lirismo? Farsa? Utopia?
Concreta antropofagia?
Fim do dia ou alvorada?

Ou nem sequer há Direitas
nem Esquerdas nem mesmo Centro
sendo isto ideias estreitas
em que, aprendiz, me concentro?

Serei eu, nascido outrora
quando só Direita havia,
que ga-ga gaguejo a História
da de-de democracia?

(Nicolau Saião)