12.10.04

Post Scriptum #380



Sharon Olds
(E.U.A., n. 1942)

PESCANDO AO LARGO DE NOVA ESCÓCIA

De visita à terra natal do pai,
uma cultura de sangue, nessa semana as crianças
educaram-se no sangue. Largavam a linha,
largavam-na, largavam-na,
tão profundo era o mar.

Flutuávamos num pequeno dóri por cima dos
tonéis de água. Elas puxavam bruscamente a linha
do fundo, uma e outra vez,
peneirando os peixes: os anzóis esgachando-se
como agulhas de esmirna nas guelras.

Ao soltar-se a farpa, o som era como plástico
quebrando. Numa caixa de madeira
no fundo do bote, os corpos de dúctil
metal sapateavam, torcendo-se, deuses
de prata desenterrados. Quieto, peixinho,
diziam as crianças, Cala-te peixinho,
com escamas nas mãos e restos de tripa nos sapatos.

Eu brincava às mães no meio disto tudo,
a esposa da América, portanto não dizia nada,
o aço quebrando as mandíbulas cerradas,
a espessura brilhante do sangue das crianças.

Tradução de Margarida Vale de Gato.