Post Scriptum #317
Charles Simic
(Sérvia/E.U.A., n. 1938)
DOIS TEXTOS
Tudo é previsível. Tudo foi já previsto. O que foi destinado não pode evitar-se. Nem sequer esta batata fervida. Este garfo. Este naco de pão escuro. Até este pensamento...
A minha avó que varre a calçada sabe. Diz que não há deus, só um olho aqui e ali que vê claramente. Os vizinhos estão demasiado ocupados vendo a TV para queimá-la por bruxa.
O homem morto baixa do cadafalso. Segura a ensanguentada cabeça debaixo do braço.
As macieiras estão em flor. Ele segue o seu caminho até à taberna da vila e ninguém despega o olho. Ali, senta-se a uma das mesas e pede duas cervejas, uma para ele e outra para a cabeça. A minha mãe esfrega as mãos no avental e serve-o.
Há tanto silêncio no mundo. Até se pode ouvir o velho rio, que na sua confusão às vezes se esquece e corre para a fonte.
Versões de António Cabrita.
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