4.8.04

O Povo É Sereno #141

Em Louvor dos Palhaços

Não por simbolismo mais ou menos evidente, não por se estar em tempo de clowns, de malabaristas, de hipnotizadores e de homens-das-forças - mas sim por no Verão a memória ser mais nostálgica, intercedendo pelos tempos de grandes alegrias, de viagens interiores, de meandros que se acariciam com a palavra, com a recordação. Um mundo de circo, fremente e encantado.
Charlie Rivel, que vi ao vivo em Madrid numa tarde de surpresas, numa matinée inesquecível, com o seu lentíssimo andar, com as suas pequenas frases entrecortadas, com o seu huuuuuu! de rosto rodando para o céu, esse som surpreendente pontuando as estorinhas comoventes, terríveis e poéticas daquele que foi considerado o melhor palhaço do mundo.
E os Irmãos Campos, portugueses retintos num elenco circense todo composto por húngaros de Linda-a-Pastora, por franceses do Cadaval, por italianos da Madragoa? E Oscarito, o palhaço bailarino com as pernas de arame que todo se desconjuntava quando Simeão, o palhaço-rico, o submetia a rudes diálogos de que aliás saía mal-ferido? E que com o seu serrote-viollino, com a sua trompete destravada, com o seu saxofone bicéfalo nos levava por todos os lugares onde o sonho pode acontecer?
E - mas agora por fora - as distintas partenaires que eram jovens em início de carreira ou madames a finalizá-la, mas inteiramente frequentáveis para olhos adolescentes (um toquezinho de inusitado que ainda lhes conferia mais sedução...)?
Deixem que me lembre destes anos de vinho e rosas...
Pois, um intervalinho antes de outras coisas que tenho ditas, aprazadas, juradas pelas alminhas.
Como que um pacote de amendoins, com vossa licença expedita, antes até de entrarem os trapezistas, os domadores e os outros acrobatas.

Nicolau Saião