21.6.04

Post Scriptum # 270



Manuel Hermínio Monteiro
(Portugal, 1953-2001)

Este poema de Manuel Hermínio Monteiro foi enviado a Nicolau Saião pouco tempo antes da sua publicação. E foi por este dado a lume, em Fevereiro de 81, na página literária do semanário alentejano "A Rabeca", que orientava.


ANTÓNIO MARIA LISBOA

Senhora mãe é uma escadaria de costas para o poente
as mãos no peito, "as mamas na varanda".
No passe-vite, nos brinquedos do menino
na fome do menino
Senhora mãe vai esmigalhando deus e o diabo
pela tarde fora
pelo silêncio adentro.

Um pardal poisa em frente ao sol do poema
vem do Norte
vem de trás do tempo
na Senhora mãe o pardal goteja
a loucura inominada
do nome das casas
um pardal de erva submete a primavera
em Novembro, Senhora mãe,
um pardal sem choro semeia o vendaval
parte vidros
sorri atrás da porta
chupa-te os dedos Senhora mãe
aniquila no teu vestido vermelho
o teu palácio apocalíptico
o teu silêncio de mina
as serpentinas de arame
nos teus olhos de escadaria
batendo maternalmente no poema
que um poema
é maior que um filho penteado.


Este post é o resultado de uma acção que junta o Quartzo, Feldspato & Mica e Eduardo Prado Coelho numa homenagem despretensiosa ao ex-editor da Assírio & Alvim. A acção, previamente combinada entre este blogue e o conhecido ensaísta, e que contou com a inestimável colaboração de Nicolau Saião, consiste na edição deste poema pouco conhecido de Manuel Hermínio Monteiro, acompanhado de uma crónica no Mil Folhas desta semana.
Obrigado, Eduardo, por teres aceite o nosso convite.