24.3.04

Umbigo #15

É por aqui que elas se penduram ou Morangos silvestres

Não, não se refere ao filme de Bergman esta todavia doce evocação. Refere-se à primavera antecipada que já se sente por estes sítios. E, sentindo-se, lá fui eu dar um dos meus passeios ao campo dos arredores. Como os camponeses já me conhecem por esses caminhos vicinais, às vezes chego a casa ajoujado com pêras, maçãs, laranjas – fruta da época. Ontem, em casa do meu amigo Gracindo, hortelão moderno à antiga, veio para a mesa um jarro do tinto e um chouricito com pão do Reguengo. Não conhecem. Mas limpam-nos a alma e as papilas, estas especialidades. Abancámos, tratámos-lhes da saúde. E no fim, com o ar um pouco encabulado, o Gracindo trouxe uns morangos “que a minha mulher comprou no supermercado” para encerrar o repasto.
Falou-se disto e daquilo e, clarete, desaguou-se na política. E o Gracindo contou-me uma estorinha em que ele teve como interlocutor um homem público em visita ao meio rural: a dada altura o nosso hortelão, um pouco ourado com a tanga, perguntou-lhe naquela conversa a dois:” Mas vocês não têm vergonha pelo que um dia mais tarde outros dirão de vocês?”. A resposta que recebeu, em tom sarcástico, foi lapidar: “Olhe, esqueça...os que vierem mais tarde serão como nós...”.
Comentários para quê? Foi um “artista” lusitano em plena e magnífica actuação...


Nicolau Saião