1.3.04

O Povo é Sereno #62

Autonomia ou impunidade?

Um professor, com mestrado e largo currículo, é despedido do lugar que ocupava numa instituição de Ensino Superior público; em seu lugar fica uma colega apenas com licenciatura, mestranda adiada e sem currículo que se aprecie. A instituição justifica o procedimento dizendo que esta lecciona disciplinas “carenciadas”, tão carenciadas que serão extintas em breve… Numa Universidade há um docente que dá aulas pelo telemóvel. Isto é, põe os alunos a trabalhar, vai para o café ou para onde lhe dá na real gana, enquanto o contribuinte lhe paga o vencimento… Outro professor, numa Universidade pública, lecciona, na cadeira de Cultura Portuguesa dum mestrado, apenas literatura norte-americana… Outro ainda sumaria aulas que não deu, com matérias que nem sequer fazem parte do programa da disciplina… O professor de um Instituto Superior é ofendido gravemente por uma aluna; a instituição em que lecciona não o defende e nem sequer responde ao requerimento em que solicita a abertura de um processo disciplinar; teimando ver a lei cumprida, é ameaçado pelo presidente da instituição, sendo despedido pouco tempo depois…
Estes são apenas alguns exemplos de factos infelizmente corriqueiros no nosso sistema de Ensino Superior.
Umberto Eco conta no seu romance “Baudolino” que a autonomia do Ensino Superior foi inventada por Frederico Barba-Ruiva para mais facilmente ver reconhecido o seu domínio político sobre a Itália.
Não sei que motivos levaram o poder político português a institucionalizar a autonomia do Ensino Superior que temos. A prática observável em muitas instituições vai enevoando os exemplos de boa conduta existentes em várias Universidades e Institutos deste país. Parece mostrar-nos que a autonomia serve apenas um objectivo: camuflar desmandos, justificar o caciquismo e a corrupção, consagrar a mediocridade que alimenta a estupidez, alimentar a sede de poder de gente sem escrúpulos.


Ruy Ventura