Post Scriptum #145
Mais Elytis
Ora aí está mais um excerto de "Maria Nefeli" de Odysséas Elytis, segundo grego a ser distinguido com o prémio Nobel de poesia. Elytis, um dos primeiros surrealistas gregos, que se desviou do movimento mas não o renegou, é difícil de apresentar, sobretudo num blogue, pois os seus poemas mais importantes têm a extensão de livros, cuja arquitectura é importante para o sentido. Assim, estes excertos só poderão ser considerados ligeiras amostras do que constitui a obra.
O Antifoneiro diz: PAX SAINT TROPEZANA Que paspalhona me saiu ultimamente a Terra! Anda-me a quatro e funga de alegria sus sus! Glória aos pais dos regimes reina a paz pequenos animais atrás dos grandes ali navegam barcos... Mamas pintadas calças de duas cores enormes chapéus de palha de todos os modelos brasões de ricos príncipes candidatos a masoquistas escritores à distância actores de vinte e quatro horas mijam no mar e dão pequenos gritos centro-europeus: u-u u-u! Lá em cima no céu negros vazios entreabrem-se e a osmose das almas deixa transbordar um denso fumo. De vez em quando surge o olhar de um Santo mais feroz que nunca «não tem importância a importância está noutro lado» uma multidão multicolorida anda às apalpadelas arrastando-se de olhos semi-cerrados sus sus! Pax Pax Saint Tropezana reina a paz. Tudo se diz eurocentralmente se faz se refaz com facilidades a prestações. Tempo de reposições: rebenta pneu – põe-se pneu perde-se Jimmy – encontra-se Bob. «C'est très pratique» dizia Annette a bela empregada de mesa do Tahiti. Dezanove amantes lhe gravaram o nome no peito junto com o lugar de onde vinham uma pequena geografia de ternura. Mas creio que no fundo era homossexual. Come o progresso com as suas cascas e caroços. |
E Maria Nefeli: O PLANETA TERRA Ah este planeta não é feito apenas de galinhas e carneiros e outras estúpidas criaturas curvadas. No extremo do Universo o desleixado com os seus oceanitos com os seus Himalaiazinhos com os seus quatro biliões de bípedes sem asas que lutam sem parar por altares e lares fontes de petróleo e outras férteis regiões. Este não é um planeta saqueado por ventos envenenados exposto a chuvas de meteoritos a pensamentos de filósofos a grandes lutas pela liberdade (sempre a nossa – nunca a dos outros). Um xadrez para corvos amestrados em ganhar sempre nos dois tabuleiros «negras aves» a que chamam «negros augures». Não não este não é um planeta antes um errar que leva muito longe a Zeus a Cristo a Buda a Maomé que também a certa altura tiveram que se fanar para que todos nós por simples inércia ficássemos na posição ajoelhada. A contagem decrescente até à completa destruição. A única coisa que ficará intacta será a vingança. O ferro e a pedra lá têm os seus recursos hão-de abater-nos e entraremos numa nova idade de pedra tremeremos de medo entre brontossauros enlouquecidos; então teremos talvez saudade da exactidão e perfeição de um relógio Patek Philippe. E vós Senhores da Tecnocracia um pouco mais para a direita por favor: guardai-me um lugar em Alfa de Centauro e logo se verá. Infelizmente até a terra gira à nossa custa. |
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