O Silêncio é de Ouro #37
Eu, triste inculto, me confesso: não consigo gostar das críticas de discos do suplemento “Y”, do jornal Público. Não consigo ter paciência para tantos discos “hipnóticos”, para a chuva semanal de músicos “visionários”, para a enxurrada de acordes “oníricos” que por lá se ouvem. Enfim, não consigo ter pachorra para o fogo cerrado de adjectivos e figuras de estilo que um simples disco pode despoletar.
Apenas um exemplo: o texto de Fernando Magalhães dedicado aos Einstürzende Neubauten, saído no Y de 13 de Fevereiro, a propósito do seu novo disco “Perpetuum Mobile”. Trata-se de uma espécie de visita guiada pela carreira dos alemães. Até aqui, tudo bem. Muito agradecido. O pior é quando ficamos a saber que, nos seus primórdios, os Neubauten provocavam “ventanias tóxicas” e libertavam “gases venenosos”. E que hoje, apesar de envergarem um aburguesado smoking, ainda são capazes de nos “romperem a pele com um bisturi”.
Mas há mais. O seu disco “Haus der Luege” (1989) é um álbum “inundado com esperma de cavalo” e “Silence is Sexy” (2000) traz consigo “um silêncio de mau agouro a envolver um erotismo sonoro malsão, com palavras que se infiltram na mente como agulhas de ponta incandescente e sons regurgitados das regiões mais recônditas do inconsciente”. Já “Perpetuum Mobile” pegou nesse silêncio e “insuflou-o de ar comprimido, fazendo a música subir como um balão que esconde nas suas entranhas uma colónia de vermes”. Portanto, “eles subiram pelo ar” e “é de lá que desencadeiam tempestades”.
E Magalhães congemina: “será ódio, será amor, o certo é que ‘Perpetuum Mobile”, apesar de cultivar, ainda e sempre, a agressão, não pretende ser repudiado mas ouvido”. E conclui: “Ponhamos também nós o nariz e as antenas no ar. Mas com cautela.” Depois de tudo isto, quem não a terá?
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