O Povo é Sereno #56
Ainda a propósito dos putativos candidatos sociais-democratas às eleições presidenciais, publicamos mais dois textos, de Nicolau Saião e Ruy Ventura.
Cavaco? Vocês falam-me em Cavaco? Pois também eu vos poderia falar nesse homem de Estado e no alegrão (melhor dizendo: momentos de fruição hilariante) que ele me deu numa certa tarde em que o ouvimos, pela rádio, garantir - entre outras coisas mais sinistras - que se ia embora para casa porque a sua Senhora até já dissera que sentia a sua falta nos serões patriarcais.
Vou ser sucinto: tenho uma particular simpatia pela Senhora de Cavaco e Silva. E isto é tão verdade como eu chamar-me Nicolau. Esclareço-vos já: quem me vê não diz (ou dirá? Pavorosa questão…) que sou um distraídão de marca. Podia aqui contar-vos algumas que vos lançariam talvez em convulsões, mas sintetizo e digo-vos que lá pelos princípios do consulado do nosso estimado Professor houve um lançamento numa Livraria da capital que teve como alvo um livrito colectivo em que também perpetrei versalhada.
Enquanto os oradores e, depois, o João d’Ávila, faziam considerações à poemaria (d’Ávila foi para os declamar, aliás com acerto), eu olhava da mesa a assistência – e sentia que alguma daquela gente a conhecia não sabia bem donde.
No final, quando se entrou na parte mais gostosa (os comes e bebes e os autógrafos) eis que uma senhora de aparência digna e cordial se chegou ao pé de mim com o livrito na mão e me disse com lhaneza (que hoje, à puridade, agradeço): "Era para mim e para o meu marido…". Com diligente cordialidade, inquiri: "E o seu nome e de seu esposo?...". E a senhora, com toda a delicadeza:" Maria e Aníbal…". Já estão a ver, não é verdade? Mas o gesto senhoril ficou-me na memória.
A circunstância de estar ali tanta gente colunável devia-se - para além do amor à poesia bem típico dos nossos políticos - ao facto de que um dos autores era o Fernando Tavares Rodrigues, na época director-geral da Informação e sólido pêéssedê…
De modo que, escorado nessa cordialidade que em mim vive, eu peço à Senhora do distinto economista: não deixe, minha Senhora, que o seu marido vá a Presidente, sequer a candidato a tal ordálio. Terá de durante vários anos aturar toda a gente em geral e os doutores Santana e Marcelo em particular: um, pelo que se sabe. Outro, pelo que se calcula. Não falando ainda no engenheiro Guterres, no apreciado Coelho, no Miguel da TVI…
Eles não perdoam o mínimo deslize. E são tremendos. Piores mesmo que o celebrado Durão.
Seria uma inquietação permanente. E, depois, o estado da nação…não dá para finalizar em beleza.
O Professor que se deixe estar aí por casa, a ler uns poemazitos, a jogar à bisca-lambida com as visitas, a pensar em relatórios e contas… E que se lixe o tabu.
Valeu?
Fique, minha Senhora, com a estima e o respeito do
NS
Nicolau Saião
A minha resposta à contenda que se tem gerado em torno das eventuais candidaturas de Cavaco ou de Santana à presidência da república é pura e simples: entre um e outro, venha o diabo e escolha! Se um representa o populismo fácil, o outro é o emblema do autoritarismo tecnocrata – ao fim e ao cabo faces da mesma moeda. Santana agradará às moças e às senhoras de meia-idade versadas em lixo televisivo, Cavaco aos nostálgicos do tempo em que os estudantes e agentes sociais eram rigorosamente vigiados. Por sua vez, enquanto o primeiro é um bife para quantos gostam de branquear a promoção da mediocridade e da estupidificação (os cegos são muito mais fáceis de governar, já Salazar o pensava), o segundo representa aquilo que os nossos companheiros de União Europeia hoje criticam em Portugal: a aposta no império do betão em detrimento do investimento nas pessoas e na sua dignidade social e cultural. Pedro Santana Lopes afirma que quer ser presidente para manter no poder (e manipular) a coligação PSD/PP, jamais sufragada pelo voto popular, uma coligação que parece querer incendiar o país, como já afirmaram vários analistas políticos, alguns oriundos da freguesia social-democrata. Cavaco desejará o lugar para levar o PSD sozinho ao governo, puxando livremente os cordelinhos de Barroso. Haverá diferenças? Como diz um velho provérbio, a matéria é a mesma – só mudam os odores.
Pergunto apenas: será que algum deles se preocupa verdadeiramente com os portugueses, com milhares e milhares de portugueses com estão a sofrer perante a insensibilidade das autoridades, com milhões de cidadãos apreensivos com o futuro dos habitantes deste país?
Ruy Ventura
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