Post Scriptum #128
Nicolau Saião (Monforte do Alentejo, 1946) é poeta, tradutor, pintor, jornalista, actor e, a partir deste dia, faz também o favor de ser colaborador deste blogue. Editou vários livros de poemas, entre os quais Flauta de Pan (Colibri, 1998), Os objectos inquietantes (Caminho, 1992), Os olhares perdidos (Universitária, 2000) e Passagem de nível (1992), e é também presença habitual em várias revistas literárias. Nicolau Saião junta-se agora ao nosso grupo de colaboradores com uma tradução deste "Três Poemas" do jovem autor norte-americano Cedric Elliot Morrison (n. 1961).
Cedric Elliot Morrison nasceu em Lewiston (Maine) em 1961. Viveu vários anos em Providence (R. Island) tendo-se debruçado sobre a vida e obra de H.P.Lovecraft. Vive, neste momento, em Nova Iorque.
TRÊS POEMAS
Cedric Elliot Morrison
(E.U.A., 1961)
1.
E assim chego
- colete, calça e paletó.
E sento-me, feliz da vida
na esplanada quase deserta.
Espero os ventos do sul
os musgos do norte
o sol de um pouco à esquerda do sudeste.
Talvez relinche como uma estrela fogosa
talvez chame o criado e fique mudo.
Talvez, quem sabe, me espante um bom bocado
chapéu de feltro cinzento na cabeça
dócil e omnipresente.
Que pergunta, interrogo-me perplexo
fiz a mim mesmo há pedacinho?
2.
As árvores
Não as que vi em criança
umas de roda do luar espelhado
no pequeno tanque
outras em dia de mortos
aparecendo desaparecendo
como presenças incertas
Não as árvores de repente ternas
como sementes
remotas como pedras
Mas as que gravitam em torno de nós
aflitas
silenciosas como um pensamento.
3.
Nas arribas de Cape Cod
aí pela manhã
um tipo pensativo põe-se a recordar
os tempos dilectos da juventude
quando trabalhava com o velho Miles
o carpinteiro tisnado de camisas de algodão
E ambos galhofavam serenamente
um em frente do outro, de pés em cima da mesa
na sala traseira da vetusta lojeca
atestada de móveis como dantes se faziam
perto do farol do arquipélago de Shoals.
"Quando o vento acalmava, rapariga
a morte e a doença à porta não chegavam
à porta não chegavam, digo-te eu
minha garota, minha garota bela!"
Miles, rei das cadeiras e das mesas
o das camisas baratas de algodão
Colete, calça e paletó
e às vezes uma rosa na mão direita
- mas não como se fosse um troféu.
E tudo sem palavras, sem um gesto
sem sequer uma canção que vem de longe
que vem de muito longe e ressoa.
Tradução de Nicolau Saião.
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