O Povo É Sereno #38
Fui às "Fraternités Ouvrières" (Fraternidades Operárias) comprar sementes. Estão a rir-se? Fui, sim senhor.
Desde há muitos anos, nesta terra belgo-picarda de Mouscron, um grupo de sócios (são agora mais de mil) fez um grupo de jardinagem. Junto à sede, há um grande quintal cheio de árvores em cima e hortícolas em baixo. Trata-se de uma forma de agricultura sem lavrar a terra, utilizando os próprios ciclos biológicos das plantas para alimentar o solo, que se inspira no fim de contas nas florestas, as quais, sem adubos, sem pesticidas e sem tractores, se reproduzem ao longo dos séculos.
É um jardim comestível, pleno de imaginação (até tem um pequeno "lago", isto é, um charco, para as rãs). Dado o pequeno espaço, as árvores (de fruto) são mantidas pequenas, cortando-lhe no Verão os últimos botões, por onde crescem. É um modelo para as hortas populares dos sócios. Enfim, só visto.
Dentro da sede, enormes prateleiras com milhares e milhares de sementes de toda a espécie de plantas e um grupo de sócios a organizar aquilo tudo. Escolhi as minhas sementes, fui para pagar, só tinha uma nota de 50 euros. "Não tenho troco; a tesoureira não está. Paga para a próxima" - disse-me o presidente.
Ficámos a falar disto e daquilo, eu a beber café e eles a trabalhar. Falámos de agricultura, da vida das pessoas da zona, do dialecto picardo, das fábricas que fecharam, da evolução da organização das empresas (os antigos engenheiros humanistas, os patrões com todos os seus defeitos próximos dos ofícios, depois os "japoneses", isto é os novos quadros dos anos setenta e oitenta que trouxeram novos planos, "racionalizaram" as empresas e as iam levando à falência, depois os financeiros).
Falámos do altermundialismo, do Bourdieu, do Michael Moore, do Wesley Clark. Cuspimos no Bush.
Tive que me vir embora, pois a noite descia.
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