23.1.04

KAVÁFIS DIA #1


Tendo reparado que Konstantínos Kaváfis (1863-1933) tem um certo público na blogosfera, resolvi derrogar a uma regra que tinha imposto a mim próprio e que era a de só publicar aqui traduções inéditas. Sucede que andam por aí espalhadas, em publicações de pouca expansão, algumas versões minhas do vate de Alexandria e pensei que não seria de todo impertinente dá-las a conhecer também neste blogue. A primeira será o poema “A Cidade” que foi traduzido também por José Paulo Paes , grande tradutor brasileiro, e Joaquim Manuel Magalhães.

A CIDADE

Dizes: «Vou para outra terra, vou para outro mar.
Noutro lugar, melhor cidade há­‑de haver certamente.
Será malogro, está escrito, tudo o que aqui tente
E ─ como morto ─ o coração sepultado aqui me jaz.
Por quanto tempo há­‑de ficar minh'alma em tão podre paz?
Pra todo o lado olhei, em todo o lado vi
Ruínas negras desta minha vida aqui,
Que tantos anos eu gastei a estragar, a dissipar."

Novo lugar não vais achar, nem achar novos mares.
Vai­‑te seguir esta cidade. Ruas vais percorrer,
serão as mesmas, e nos mesmos bairros hás­‑de viver,
nas mesmas casas ficará de neve o teu cabelo.
Hás­‑de ir ter sempre ao mesmo sítio, sem qualquer apelo.
Para outro lugar não há navio ou caminho
e estragares a vida tu neste cantinho
é pois igual a nesse largo mundo a dissipares.

[23, 1910]