Post Scriptum #72
A Metafísica, outra vez.
Já aqui tínhamos publicado poemas de Henry Vaughan e George Herbert (Post Scriptum #56 e 59), representantes maiores da chamada "Escola Metafísica Inglesa", na tradução irrepreensível de Rui Lage. Hoje voltamos a reincidir com Andrew Marvell (1621-1678).
Numa Gota de Orvalho é o mais extenso dos três poemas, e foi "o mais difícil de traduzir", nas palavras de Rui Lage.
Esta tradução ainda está inédita e deverá ser publicada no próximo número da revista Águasfurtadas, que se encontra em preparação.
Numa Gota de Orvalho
(Andrew Marvell)
Vê o orvalho do Oriente
Do seio da manhã vertido
Nas rosas despontando,
Mas da nova casa negligente
Pois em clara região nascido,
Em seu globo se fechando
E no seu recolhimento
Vai figurando o nativo elemento.
Como a púrpura flor altiva,
Mal a terra aflorando
Mas o olhar aos céus retornando,
Brilha de luz dorida;
De si mesma a lágrima
Pois que já do firmamento despedida.
Rola inquieta, insegura,
Temendo crescer impura:
Até que o sol, em a vendo,
Com pena ao céu a devolva aquecendo.
Assim a alma, aurora
Da límpida fonte do eterno dia,
Se dentro da humana flor avistada:
Recordando de outrora a altura,
Foge da pétala adoçada;
E a própria luz reunindo pura,
Nas esferas onde pensa em redor
Mostra, no céu menor o céu maior.
Em que débil forma encerrada
E de toda a sorte fugidia:
Põe fora o mundo arredondada
Mas acolhe dentro o dia;
Escuro em baixo, claro acima:
Aqui ódio, ali amor ensina,
Quão leve e fácil pois partir:
E quão disposta a ascender.
De um ponto apenas conseguir,
Tudo em volta aos céus erguer.
E o divino orvalho assim vai destilando
Branco, inteiro, mas frio e gelado.
Gelado na terra: que evaporando
Sobe rumo às glórias do sol dourado.
Tradução ainda inédita de Rui Lage.
On a Drop of Dew
See how the Orient Dew,
Shed from the Bosom of the Morn
Into the blowing Roses,
Yet careless of its Mansion new,
For the clear Region where ‘twas born,
Round in its self incloses,
And in its little Globes Extent,
Frames as it can its native Element.
How it the purple flow’r does slight,
Scarce touching where it lyes,
But gazing back upon the Skies,
Shines with a mournful Light;
Like its own Tear,
Because so long divided from the Sphear.
Restless it roules and unsecure,
Trembling lest it grow impure:
Till the warm Sun pitty it’s Pain,
And to the Skies exhale it back again.
So the Soul, that Drop, that Ray
Of the clear Fountain of Eternal Day,
Could it within the humane flow’r be seen,
Remembring still its former height,
Shuns the sweet leaves and blossoms green;
And, recollecting its own Light,
Does, in its pure and circling thoughts, express
The greater Heaven in an Heaven less.
In how coy a Figure wound,
Every way it turns away:
So the World excluding round,
Yet receiving in the Day.
Dark beneath, but bright above:
Here disdaining, there in Love,
How loose and easie hence to go:
How girt and ready to ascend.
Moving but on a point below,
It all about does upwards bend.
Such did the Manna’s sacred Dew destil;
White, and intire, though congeal’d and chill.
Congeal’d on Earth: but does, dissolving, run
Into the Glories of th’ Almighty Sun.
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