Post Scriptum #47
Já aqui publicámos um poema da poeta grega Kiki Dimoulá (n. 1931). Hoje trazemos outro. A tradução, mais uma vez, é da responsabilidade de Manuel Resende.
COMO QUEM ESCOLHE
É sexta-feira hoje vou à praça do mercado
dar uma volta nos jardins decapitados
a ver o perfume dos orégãos
cativos nos molhos.
Vou ao meidia quando caem as cotações
encontra-se fácil o verde
entre feijões abóboras malvas e lírios.
Ouço ali com que coragem falam as árvores
com a língua cortada dos frutos
oradoras empilhadas as laranjas e as maçãs
e alguma convalescença começa a ganhar cor
nas faces amareladas
de uma mudez interior.
Raramente compro. É que nos dizem escolhe.
Isso é facilidade ou problema? Escolhemos e depois
como levantar o peso insustentável
que tem a nossa escolha?
Ao passo que aquele aconteceu, que pluma! No princípio.
É que depois as consequências põem-nos de rastos.
Também insustentáveis. No fundo é como quem escolhe.
Quando muito compro um pouco de terra. Não para flores.
Para me ir habituando.
Nisto não há escolhe. Nisto, é de olhos fechados.
Tradução inédita de Manuel Resende.
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