24.9.03

Post Scriptum #6

QUE COMOVENTE, UM MAU POETA

Que comovente, um mau poeta. Não falam dele
há muitos anos; depois, lentamente, esquecem-no.
Inspirado e branco, agora cambaleia, vacilam
os botões no sobretudo roto e assobia poemas inéditos
ao vento de Inverno.
Que orgulho e força. No seu rosto,
ódio e inveja semelham, de longe, algo como
tristeza etérea. A seu lado, os famosos,
que incensaram artigos pagos e celebram
plateias selvagens, mercadores, ou aventureiros.
Na calva, na fronte altiva de apóstolo, pôs-lhe a vida
coroa de lágrimas, divinizando
sonhos da mocidade, em que prefere acreditar.
Até a má alimentação e magreza que dá
a tísica é uma questão de estilo. Como nos seus livros.
Crítica, literatura - em vão falais.
Ele é o idealismo. Ele é o poeta verdadeiro.

Este poema foi escrito pelo húngaro Kosztolányi Dezso (1885-1936), em 1924.

(Tradução de Ernesto Rodrigues, Antologia da Poesia Húngara, Editora Âncora, 2002)